O mundo e o Homem




O mundo e o Homem e o Homem no mundo. Desde os Gregos até aos Renascentistas. E desde os Renascentistas até hoje. A perfeição humana é uma ideia amplamente pensada, sonhada e inventada. Já estamos habituados a ouvir falar de seres humanos ideais e de uma harmonia que apenas vê limite no equilíbrio. Mas, afinal, porquê falar de perfeição, se toda a gente sabe que ela não existe?
Camões é um Homem do passado que viveu um dia no presente, mas que no fundo sempre pertenceu mais ao futuro. “Nua mão a pena e noutra a lança,” talvez seja um dos poucos exemplos em que vemos o Tempo entre nós e o Poeta d’ Os Lusíadas. A verdade é que já nem escrevemos com uma pena nem vemos nenhum Homem com lanças do meio da rua, mas também é provável que a questão mais importante não seja esta. O ser perfeito no ideal de Camões talvez já não reflicta exactamente o Homem completo e ideal em peno século XXI. Na verdade, nem sei bem o que é preciso para representar esse paradigma de completude. Possivelmente, podemos pensar em alguém que domine com total conhecimento duas áreas opostas, como as Letras e as Ciências; um Homem que tenha em si a Razão e a Emoção em perfeito equilíbrio; um faz-tudo; um prémio Nobel da Literatura que também é cirurgião… Quem sabe…?
A prova de que esse modelo de perfeição é inexistente revela-se precisamente com a sua mudança consoante a época. Hoje ninguém pede aos jovens portugueses que partam em armadas e conquistem o ouro do Brasil ou que descubram as terras do Oriente. Pelo contrário, talvez nos seja pedido cada vez mais porque a perfeição é tudo o que de bom já foi feito e, como devem calcular, não é pouco. No entanto, quando olho para Camões posso confessar que sou bem capaz de encontrar essa máxima de «armas e letras», mas acredito que Homens como ele sejam uma exceção, caso contrário tínhamos arquivadas milhares de epopeias. O modelo de perfeição humana até pode existir, mas é subjectivo, o que à partida o torna alcançável e inalcançável; é exigente e talvez nos impeça até de nos tornarmos ideias se o quisermos cumprir. Ninguém faz tudo, ninguém é tudo. É tão fácil dar em louco apenas a ser aquilo que somos, imaginem agora se fôssemos tudo e se soubéssemos de tudo.
No fundo, ser o Homem ideal talvez não seja sobre a quantidade de oceano que conseguimos ver, mas a amplitude e a força que inventamos ao abrir os olhos. Não é preciso saber tudo, mas é preciso saber que saber é necessário. Pessoa dizia que “ o perfeito é desumano, porque o humano é imperfeito”. A invocação que Camões faz às Tágides não é deste mundo e a heroicidade de alguns Homens também não o parece ser. Então os Homens são capazes de feitos perfeitos, mas serão sempre imperfeitos? E agora, como é que isto se explica? Também não sei. Dali é que dizia para não termos medo da perfeição, uma vez que nunca iríamos alcançá-la. Camões e o pintor da “Persistência da Memória” também nunca se encontraram. É pena. Seriam contemporâneos riquíssimos, com muitos modelos de perfeição humana diferentes à mistura.

Leonor Gaião, 11.º I



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