Ser criança...


Hoje, não me apetecia realmente sair. Estava um dia frio e húmido e ainda me apetecia menos por ser fim-de-semana e estar sozinha em casa. Olhei para o céu, para aquele quadro cinzento e inerte, não havia realmente grande coisa para apreciar, mas então lembrei-me como o tempo influencia o meu estado de espírito. Provavelmente, se estivesse um dia azul e quente, eu estaria, ainda que não a vaguear pelas ruas sem rumo, na varanda a olhar para o movimento da rua ou a ler um livro enquanto apanhava sol.

Devo estar realmente deprimida para falar do tempo, é a típica conversa quando não se tem mais nada para falar. Mas a verdade é que é exactamente isso que se passa, parece que estou enclausurada em casa sem nada para fazer e sem ninguém para falar. Só me falta falar para as paredes ou então falar com gatos tal e qual como as velhotas fazem. Há também sempre a opção de falar com os cães, ao menos estes abanam a cauda. E logo, por ironia do destino, eu tenho ambos os animais de estimação em casa, em última solução posso sempre tentar fazer um debate com o meu gato sobre psicologia ou filosofia.

Para piorar a situação agora chove, e parece que a trovoada ainda está para chegar. Quando era pequena, tinha medo da trovoada, escondia-me debaixo da mesa e agarrava as pernas de quem passasse perto, mas agora que sei que não passam de fenómenos naturais com um pouco de física aqui e química ali, até me dá um certo gozo olhar para ela e o barulho já não me atormenta. Será por agora eu a entender que deixo de ter medo? Ou será por esse medo já ter sido preenchido por outros ainda piores?

Acho que a resposta é que agora tenho um medo de longe maior: Tenho medo de crescer! Não quero responsabilidades, cada dia que passa mais medo tenho do que o futuro me reserva. O que vai ser de mim?

Vou ser uma adulta obcecada pelo trabalho com amigos por favor ou conveniência, ou serei eu a atender numa caixa do supermercado, estarei eu numa secretária a aturar uma data de alunos indisciplinados? Ser criança é tão bom, há sempre alguém para nos pegar a mão e ajudar a atravessar a rua, mas quando crescemos quem cuida de nós?

Pelos vistos estou de tal forma desesperada, que, se não morrer por tédio, morro por uma preocupação absurda, porque é que esta preocupação me cega? Tento fazer com que ela desapareça, mas ela está sempre presente, sempre preparada a assombrar. Antes fosse um fantasma, ao menos esses só aparecem à noite e se tivermos a luz desligada.

São cinco horas, mas parece que já passaram dois milénios. Estou a entrar em estado de paralisia cerebral, para além de falar do tempo, já faço comparações que em nada têm a ver, mas, como dizem, a esperança é a última a morrer. Prevêem bom tempo para o final da tarde. Mais tarde ou mais cedo, as coisas acontecem e não há volta a dar, eu hei-de crescer, mas até lá…

Finalmente, o mau tempo parece estar a cessar, já dá para ver uma pequena faixa de azul a abrir no céu e uma brisa quente percorre o meu quarto, recebi um telefonema de um amigo para ir sair e entretanto a minha mãe chegou. Peguei no casaco e fechei a porta da rua, nem tive tempo de o vestir, ou melhor, quando cheguei à rua estava um dia de Primavera, tive que voltar para casa para devolver o casaco e dizer à minha mãe que afinal não esperasse por mim para jantar.

Carolina Martinho, 11ºE, Escola Secundária de Camões

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