O Piano
Seguiu pelo corredor, observando as portas
fechadas, imaginando as divisões, agora vazias, desprovidas dos móveis que,
embalados, já seguiam pela estrada em direção a um novo começo. Estacou. A
porta encontrava-se entreaberta. Parou, hesitante, com a mão na maçaneta. Abriu
a porta. Aproximou-se dos cortinados e puxou-os para o lado, de modo a deixar a
luz entrar, iluminando a cena. A forma do pano branco já deixava transparecer o
objeto sobre o qual se estendia, o qual protegia. Aproximou-se com passos cautelosos,
reticente. Estendeu a mão e retirou o pano, levantando uma nuvem de poeira em
seu redor. Aqui estava ele. Levantou o tampo e, com a ponta dos dedos,
percorreu a fileira de teclas, a madeira finamente trabalhada e o veludo do
assento sobre o qual se sentara inúmeras vezes. Já se esquecera das horas
passadas naquela sala, envolvida pela música, por uma paixão que parecia não
ter fim. Sentiu um aperto. A frustração envolveu-a. Com o indicador, tocou numa
tecla. Sobressaltou-se com o som. Riu-se para si. Experimentou tocar um acorde.
Uma lágrima brilhou no canto do olho, deslizando-lhe pela face. Sentou-se,
firmando os pés nos pedais. Começou a tocar, lentamente a princípio, adquirindo
um ritmo frenético à medida que ia avançando. Esqueceu-se de onde estava, de
quem era. Deixou-se envolver pela música que a rodeava. Com a última nota,
ergueu-se. Sentia a cara inchada, ressequida e as mãos dormentes. Fechou o
tampo. Estendeu o pano novamente. Caminhou em direção à porta, decidida. O
vazio que antes sentira, que a consumira, desaparecera, fora preenchido. Antes
de trancar a porta olhou uma última vez para ele, para o seu piano. Percorreu o
corredor, a melodia ressoando na sua mente, a cada passo que dava. Ao sair,
lançou um último olhar aquela que tinha sido a sua casa, aquela que a vira
crescer e que agora, a via a ir-se embora. Dobrou a esquina e, de repente, uma
nova melodia surgiu-lhe, sentiu-a na ponta dos dedos, no desejo ávido de
percorrer novamente aquelas teclas. Surgiu-lhe, como uma réstia de esperança,
no caminho que agora, se estendia à sua frente.
Verónica
Ingham, 11.º H
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