A Caminhada




Passos firmes e decididos. Nada mais do que longos passos que carregam o chão com firmeza, calcando-o num instante demorado. Estava decidido a seguir aquele caminho. Era uma caminhada longa, mas também a certa.
As folhas que se amontoavam no chão escorregadio funcionavam como um travão, tudo parecia perder a firmeza, a sua mente fugidia tentava também escapar à longa caminhada, cair naquele solo desconhecido e ficar inerte. A inércia é a opção mais acessível aos indecisos. E assim, apesar de tudo, parecia não valer o esforço. Caminhar sozinho. Contar todas as pedras de um longo percurso. Caminhar distâncias fora do horizonte, quando o nosso corpo se move, mas o espírito cimentado está ainda a contemplar a primeira pedra. Passar cada obstáculo que se opõe, quando a banda sonora na sua cabeça continua a tocar. Mas tudo aquilo já fora combinado inúmeras vezes antes. Um eterno ensaio, repetido, para a peça que nunca iria estrear. Assim, sempre que se tratava de passar à acção, o chão parecia outra vez mais escorregadio e a firmeza daqueles passos, quando passaram a porta dela, desvanecia-se, uma e outra vez. Foram perdidos, algures a meio da história. Perderam destreza, sentido e motivação. Agora arrastam-se observados por um par de olhos do verde mais seco. Reconhecia cada pedra. Sim, eram já como um mapa.
Olhos negros. Olhos negros e envoltos por cabelos negros. Sobressai a pele pálida. É essa a imagem cravada na sua cabeça. Reconhecia o seu cheiro, o seu perfume, a sua essência… Agarrou-se a ele. No entanto abriu os olhos e…nada. Mais uma pedra. Nada de longas emoções, nem sequer novas ou elementares… Era simplesmente ele, combatendo múltiplas ideias na sua cabeça, múltiplas entidades. Nada de novo.
Ele sabia-o. Quando percorria aqueles trilhos estava a ser observado. A longa calçada era apenas uma longa calçada. Nada de especial para dizer. Ela caminhava à sua frente, ele esforçava-se para caminhar paralelo a ela, atravessado pela sua sombra, como se assim fizesse um pouco mais parte dela. Agarrou com mais força o disco debaixo do braço. Era a razão para tudo aquilo talvez. Ou talvez a desculpa. Apertou-o, como se esperasse que todos os medos e frustrações se passassem para ele e, como se nada fossem, desvanecessem. Sentia-se como carne para canhão. Uma gazela em campo aberto, na mira do predador. Estava pronto para desfalecer a qualquer momento. Abatido pelo inimigo invisível que é por vezes o nosso espírito. Os sentimentos misturam-se, numa jaula, numa eterna claustrofobia de ideias que querem sair, ser livres de uma vez por todas. Mas a batalha é interior. Nada transparece para o exterior, julgamos nós…
Sigo os passos dela. A beleza etérea. Embrenhamo-nos pela mata, naquela linha, na paralela. Um novo acorde na banda sonora. É agora menos monocórdica. “Apareci” disse-me ela. Frente-a-frente. O meu braço estendeu-se num movimento lento, queria agora que os segundos se estendessem, eternos. Ansiava o toque leve, o mínimo sinal, aquele fácil sorriso. Todas as sementes no nosso jardim lutam para florescer, mas o momento foi adiado. Desmaio novamente para o sonho. Ela vira as costas, já com o disco na mão. O que é que isto significa para nós? Nunca conseguirei mudar os meus jeitos. O amor deixa-me tão frio.
A paralela volta a formar-se. Esta é para sempre. Os violinos entram na banda sonora na minha cabeça anunciando o final dramático. Afundei-me no sonho impossível!

Isa Marques, 11ºE, Escola Secundária de Camões

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