Desejo de ser um outro




Em pleno alvoroço de sentimentos, emerge o desejo flamejante de habitar outro ser. Quem habita é a alma, claro está, pois é a única que pode habitar um ser e controlar um coração, isto é, se existir algum coração controlável.

Habitando outro ser com outros sentimentos, outras vivências, outros pensamentos, poderei perder esta monotonia de ser eu mesmo. Falta-me vida e vigor, e do enfado surgem desejos, esses de apáticos não têm nada, para além do seu proprietário. Necessito de outro coração, pois o meu já está enferrujado, perdeu a sua loucura nos infelizes devaneios e utopias. Necessito de outra personalidade, uma diferente, ao menos remoçada e interessante, que não tenha a tendência de querer escrever um texto sobre desejar habitar outro ser.

Deste desejo indúctil surge uma resolução. Serei outro ou serei outros mil, assim terei para onde fugir das minhas tristezas e dos meus erros. Contudo, em segundos pensamentos, não encontrarei novas tristezas e erros próprios de um outro ser? Acho, pois, que o ponto crucial desta questão existencial é que não posso fugir de sentimentos, porque estes estão ancorados na alma, dona de meu ser. Não há fuga possível deste labirinto emocional, contudo seria deveras interessante experienciar as mágoas e desconsolos de outro ser, e, se nestes já sou experiente, o que tenho eu a temer?

Não pensem, leitores, que a minha resolução se trata de autossabotagem, não poderiam estar mais enganados se esse fosse o caso. Apenas me tornarei mil para experienciar mil amarguras e permanecer em constante fuga, pois é esse o desejo da minha alma. Tornar-me-ei, então, num sábio poeta, ou melhor, em mil.

 Henrique Sousa, 12.º J 

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