O homem do guarda-chuva amarelo




O homem do guarda-chuva amarelo tinha olhos d’aço e lábios de cabedal, tinha pés frementes e mãos lânguidas.
O homem do guarda-chuva amarelo tinha cabelo de quem não ama e sonhos de quem não vive.
O homem do guarda-chuva amarelo caminhava na chuva como alguém que quer querer, mas não sabe o quê, com a inesgotabilidade do oceano das palavras dos passantes.
Nada mais longe que o seu destino, caminhava no limite da verdade a jogar às escondidas com a verdade.
Nada mais perto que a sua derrota, parecia uma folha que, levada pelo vento, cai no esgoto.
Os sapatos cobertos de lama e arrependimentos, ator mudo e cinzento de um filme antigo de que se perderam as legendas, mexia-se atentamente, rastejando sob o sol a oito varetas.
O homem do guarda-chuva amarelo não tem nome, não tem rosto, não tem casa nem país, não tem sentimentos nem pensamentos, não tem profundeza nos olhos nem sangue nas veias, não tem sorriso no corpo nem lágrimas nas pestanas.
O homem do guarda-chuva amarelo não tem paixão no lápis nem arrebatamento no abraço, não tem morte nem tem vida.
O homem do guarda-chuva amarelo perdeu o guarda-chuva amarelo e agora só resta um grão de pó na poluição da cidade.

Carolina Blu Bassano Peixoto de Carvalho, 11.º K

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