A Doença do Escritor





Pediram-lhe que escrevesse um livro. Não teria palavras suficientes para dois, vinte páginas acabariam consigo. Intermináveis rascunhos, tinta azul nas mãos. Criar, imaginar seria para si mentir, falsificar.
Muitos temas, pouca verdade. Onde haveria de arranjar a criatividade para mentir? Como imaginar um engano em que ainda não tivesse acreditado?
São dadas as ideias aos loucos, aos que podem mentir sem pecar, enganar sem remorso.
Fartou-se de histórias, divagou, refletiu. Fumou um cigarro, pois diziam que inspirava. Inspirou apenas para si uma grave doença nos pulmões. Mas seria essa mais grave que respirar? A metáfora da sua vida seria o ar. Não conseguia respirar por falta de tempo ou excesso de incapacidade. E talvez sufocasse por mudar de ares, se lhe trouxessem uma ideia ou um tema que pudesse utilizar. Logo o chegar da ideia seria o pensar em desenvolver a mentira.
Demitiu-se da editora. O seu pensamento levara-o a entender que seria injusto usar as suas palavras para explicar ou ilustrar uma imagem, um conceito, que havia chegado à sua cabeça sem ser seu. Não há recurso algum para trabalhar a ilusão. Não escrevia sem copiar o pensamento, seria isso plágio?
Quem mente cria, quem cria copia, quem copia ilude. E, justamente por isso, deitou-se decidindo que jamais tocaria numa folha. Sonolento, amedrontado, receoso de que pudesse sonhar.


Joana Belchior (pseudónimo), 12.º J

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